O “mentalismo” moderno e sua visão espiritual deturpada – Parte 1

O “mentalismo” moderno e sua visão estereotipada da Magia - Parte 1

Por Ir. Marcus Henrique

societassalomonica@yahoo.com

 

O estudo do Hermetismo se tornou algo comum na sociedade contemporânea, seja entre os estudantes curiosos e descompromissados, seja entre aqueles que preferem se arriscar na prática esotérica moderna. No cenário brasileiro, não é raro encontrarmos estudantes que se dizem “ocultistas” e que não tem nenhuma prática magística, mas leram obras como “O Caibalion” ou o “Corpus Hermeticum” e repetem seus trechos como verdadeiros “papagaios”. Porém, o que os “ocultistas” brasileiros estão esquecendo é de interpretar devidamente as obras herméticas que estão lendo, e situá-las em acordo com a Magia, enquanto ciência prática. Isso está fazendo com que a interpretação das leis herméticas fique estereotipada e rasteira, especialmente a interpretação que está sendo dada à 1ª e à 2ª lei hermética, as chamadas “lei do mentalismo” e “lei da correspondência”, respectivamente.

Hermes Trismegistus, o grande nome do Hermetismo.

O Hermetismo é um corpo filosófico e doutrinário que ganhou espaço a partir da figura de Hermes Trismegistus, lendário sacerdote egípcio que popularizou ciências como a Alquimia, a Magia e a Astrologia.

Entre os ensinamentos herméticos, merecem destaque aqueles ligados às chamadas “leis herméticas”, que narram de que forma o mundo “funciona”, como seus fenômenos físicos podem ser justificados e como devemos nos portar espiritualmente diante deles.

A 1ª lei hermética é a chamada “lei do mentalismo”, e seu texto, descrito no Caibalion, nos diz o seguinte: o Todo é Mente; o Universo é mental”.

Se analisarmos rapidamente este texto, veremos que ele é curto e que aparentemente seu significado é claro. Porém, analisando o conteúdo do texto em si, percebemos que sua interpretação não é tão simples como se imagina (ou como muitos “ocultistas” brasileiros imaginam), e abre margens para variações interpretativas que muitas vezes podem até distorcer o sentido original do texto. Talvez seja isso que esteja ocorrendo com o significado das leis herméticas e com a interpretação que está sendo feita sobre elas, no que diz respeito à magia.

Atualmente, vejo estudantes de esoterismo falarem abertamente verdadeiras “pérolas” a respeito da prática de magia, como por exemplo:

“Toda magia é mental”

“Todo efeito mágico é apenas uma ilusão, criada pela mente do mago”

Ou mesmo que

“O objetivo da magia é exteriorizar o que há no subconsciente do mago”.

 

Apesar de sabermos que a maioria dos estudantes que nos brindam com essas pérolas não tem prática mágica nenhuma, chegamos à conclusão de que essa interpretação deturpada da magia e seus efeitos não provém somente da falta de prática, mas do estudo incorreto que estão fazendo do Hermetismo. Geralmente, os estudantes que defendem esse ponto de vista psicológico da magia, usam o texto da lei do mentalismo como tentativa de sustentar seus argumentos. No raciocínio desses estudantes, se a lei do mentalismo diz que “o universo é mental”, então tudo mais que estiver contido no universo também será, e isso inclui a magia. Esse não é um raciocínio totalmente incorreto; porém…pra infelicidade dos “ocultistas” que defendem esse ponto de vista, nem todas as formas de magia são mentais, e em algumas delas a mente não desempenha sequer função primordial para a execução do ato mágico em si.

“O Universo é mental”. Mas será que a magia também é apenas uma ilusão de nossa mente?

De uma forma simples, a interpretação moderna que está sendo dada à lei do mentalismo está se guiando pela ideia de que o homem é o centro do universo, e que o sucesso ou fracasso de suas ações depende apenas de seu querer e da força de sua Vontade. Assim, se o texto da lei do mentalismo nos diz que “o Todo é mente”, os ocultistas modernos interpretam esse “Todo” como “Tudo” e o relacionam ao homem; dessa forma, os estudantes modernos concluem que “Tudo é mente” (tudo é “mental”), e sendo assim o homem não precisa recorrer a nada fora de si, já que tem em si tudo de que precisa pra operar magia (sua mente). Só que o erro começa justamente nesse ponto: o “Todo” citado na lei do mentalismo, não significa o “Tudo” que os estudantes modernos interpretam incorretamente. Quando se diz que “o Universo é mental”, e que “o Todo é mente”, na verdade o Hermetismo está deixando claro que a criação do Universo foi um ato mental, pois foi um ato gerado da mente criadora universal (Deus). Porém, isso não quer dizer que o ser humano, mesmo sendo parte direta da criação, pode “criar” apenas a partir de sua mente. Por mais “poderosa” que seja a mente humana, ela não tem capacidade autônoma de criar algo no físico, estando fora da influência do Altíssimo se não fizer uso da Fé, da Técnica e de sua Vontade. Por isso, o fato do “universo ser mental” não faz da magia praticada pelo ser humano, algo meramente psicológico.

O motivo dessa interpretação distorcida da lei do mentalismo é muito claro: há uma diferença nítida entre a lei hermética do mentalismo e a interpretação psiquista que se tem feito dessa lei (o chamado “mentalismo moderno”). E essa interpretação equivocada não ocorre apenas com a 1ª lei hermética; a 2ª lei hermética (lei da correspondência) também sofre com essa mesma distorção na interpretação de seu texto. No Caibalion, o texto da lei da correspondência é claro: O que está em cima é como o que está embaixo. E o que está embaixo é como o que está em cima”.

A 2ª lei hermética nos diz que, devido os limites do ser humano, ele não consegue enxergar a magnitude do cosmos infinito, e não consegue enxergar nem a si mesmo como representante do Macrocosmo. A lei da correspondência nos diz que as verdades do Macrocosmo também encontram eco no microcosmo, já que “o menor” (o microcosmo) é uma equivalência do maior (Macrocosmo).

O “selo de Salomão”, simbolizando a lei hermética das correspondências. Apesar de ser uma “analogia de Deus”, o homem não é igual a Deus, e portanto não é uma divindade autônoma como o pensamento moderno sugere.

Porém, o que o pensamento moderno prega (e os “ocultistas” brasileiros seguem…) é que o homem é “seu próprio deus”, e se ele tem em si tudo que precisa (sua mente, de acordo com a interpretação errada da lei do mentalismo), então ele tem totais capacidades de controlar seu universo do modo como quiser, sendo a única divindade de seu mundo.

Essa interpretação da lei hermética da correspondência não poderia estar mais equivocada. O ser humano é uma correspondência, e não algo igual a Deus. A similitude do homem em relação à divindade vai até o ponto da potência: o homem é um deus em potencial, mas não uma divindade realizada. Todavia, muitos estudantes de esoterismo preferem acreditar que a magia é fruto da “divindade do Homem”, e do fato dele já ter tudo de que precisa pra operar magicamente (sua mente). Talvez por conta disso, muitos estudantes “ocultistas” no Brasil tem sempre o texto da 2ª lei hermética “na ponta da língua”, e repetem exaustivamente a frase “como o é encima, o é embaixo”, como se fossem verdadeiros papagaios…na tentativa de justificar sua própria soberba através de um mentalismo apegado a uma suposta “independência espiritual”.

Vimos nesta 1ª parte do artigo, que a interpretação que está sendo dada às leis herméticas está sendo deturpada e baseada em um raciocínio mentalista rasteiro. Porém, essa distorção interpretativa não está sendo causada apenas por falta de estudo ou de prática mágica dos “ocultistas” brasileiros. Na 2ª parte do artigo, faremos uma revisão histórica para descobrir qual a origem desse pensamento psiquista que tem invadido a magia moderna nas últimas décadas.

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